Não há tarja preta que me segure. Quando se está no
fundo do poço, chegamos a nos iludir achando que não dá para ficar pior. Mas
quanto mais a gente cai, mais percebe que é possível cair. Eu estou em queda
livre. Meu mundo desaba todo o maldito dia. Todo amanhecer é um fardo. Durmo
sob o efeito dos comprimidos. Acordo ''para'' a realidade e ela continua cruel.
Sim, os outros podem e são, demasiadamente, cruéis com o que sentimos. Não importa
o quão grave seja nossa dor, só veem como drama. Ou que você está exagerando.
Até te encaixam em rótulos para te julgarem ainda mais. Duvidam do que sente.
Você agora é reduzida à uma obsessiva-possessiva-compulsiva. Meu deus. A louca.
De um tempo pra cá, me vi transformada em uma
hipocondríaca. Eu, que odiava remédio, passei a adorar tomar comprimido. Pra
tudo. Tinha dores de cabeças terríveis e severas, por isso devo ter tomado
todos (ou, pelo menos, a maioria) dos mais diversos comprimidos do mercado para
este mal. Já a minha ansiedade extrema me fazia (e ainda faz) tomar sulfa como
calmante, mesmo sabendo das consequências do seu uso constante e descontrolado.
Ia tomando outros remédios para o estômago, gripe,
mais uma para alguma dor muscular insistente e assim a bolsinha de remédio
enchia cada vez mais e era preciso ser trocada por outra maior. E maior. E
maior ainda.
Na maioria das vezes, engoli meus comprimidos
querendo engolir minhas infernais dores mentais. Eu poderia nem estar sentindo
uma dor física de fato, mas tomava pelo relaxamento que aquilo me causa e que
continua causando. Ainda sim, nenhum deles me traz o efeito desejo. Nem mesmo
os comprimidos da felicidade, os que deveriam me trazer calma, paz,
tranquilidade. Um sono, certo tempo dopada e altos lapsos de memória. Sem mais.
Nem menos. Eles não trazem minha vida de volta. Meus comprimidos não são
mágicos. São caros. Exigem rotina e responsabilidade, o que nem faço ideia do
que queira dizer neste exato momento. Não tenho a mínima regularidade em
horários. Emendo remédios ''perto'' um do outro ou até tomo com refrigerante.
Algo bastante saudável, não é?
Certa vez descobri que o remédio que uma
neurologista havia me receitado para minhas enxaquecas crônicas era um
anti-depressivo, passei a toma-lo quando tinha a vontade absurda de querer
fugir do mundo. Incontáveis foram as vezes que o tomei para me desligar deste
plano. Dormia por um dia seguido, basicamente. Sem sair da cama, nem nada.
Creio que, a partir dali, eu me joguei de cara num processo depressivo sem
volta. Passavam-se os dias, as semanas e eu na mesma situação deplorável.
Daquelas de causar pena mesmo, sabe? Mas eu ficava ali, trancafiada num espaço
minúsculos, que mal cabia meus pensamentos desprezíveis, muito menos meu corpo
que, aos poucos e assustadoramente, ia definhando.
Agora, o efeito do coquetel de hoje já começa a
bater. Abater-me. Mais uma vez. Por completo. Os olhos pesam como guilhotinas.
Eu estou retalhada. Visão turva. Como se tudo girasse ao meu redor. Cada vez
mais veloz e furioso. É hora de deitar. Amanhã todo martírio retorna.