Dos comprimidos que engoli a seco

domingo, 28 de junho de 2015


Não há tarja preta que me segure. Quando se está no fundo do poço, chegamos a nos iludir achando que não dá para ficar pior. Mas quanto mais a gente cai, mais percebe que é possível cair. Eu estou em queda livre. Meu mundo desaba todo o maldito dia. Todo amanhecer é um fardo. Durmo sob o efeito dos comprimidos. Acordo ''para'' a realidade e ela continua cruel. Sim, os outros podem e são, demasiadamente, cruéis com o que sentimos. Não importa o quão grave seja nossa dor, só veem como drama. Ou que você está exagerando. Até te encaixam em rótulos para te julgarem ainda mais. Duvidam do que sente. Você agora é reduzida à uma obsessiva-possessiva-compulsiva. Meu deus. A louca.

De um tempo pra cá, me vi transformada em uma hipocondríaca. Eu, que odiava remédio, passei a adorar tomar comprimido. Pra tudo. Tinha dores de cabeças terríveis e severas, por isso devo ter tomado todos (ou, pelo menos, a maioria) dos mais diversos comprimidos do mercado para este mal. Já a minha ansiedade extrema me fazia (e ainda faz) tomar sulfa como calmante, mesmo sabendo das consequências do seu uso constante e descontrolado.

Ia tomando outros remédios para o estômago, gripe, mais uma para alguma dor muscular insistente e assim a bolsinha de remédio enchia cada vez mais e era preciso ser trocada por outra maior. E maior. E maior ainda.

Na maioria das vezes, engoli meus comprimidos querendo engolir minhas infernais dores mentais. Eu poderia nem estar sentindo uma dor física de fato, mas tomava pelo relaxamento que aquilo me causa e que continua causando. Ainda sim, nenhum deles me traz o efeito desejo. Nem mesmo os comprimidos da felicidade, os que deveriam me trazer calma, paz, tranquilidade. Um sono, certo tempo dopada e altos lapsos de memória. Sem mais. Nem menos. Eles não trazem minha vida de volta. Meus comprimidos não são mágicos. São caros. Exigem rotina e responsabilidade, o que nem faço ideia do que queira dizer neste exato momento. Não tenho a mínima regularidade em horários. Emendo remédios ''perto'' um do outro ou até tomo com refrigerante. Algo bastante saudável, não é?


Certa vez descobri que o remédio que uma neurologista havia me receitado para minhas enxaquecas crônicas era um anti-depressivo, passei a toma-lo quando tinha a vontade absurda de querer fugir do mundo. Incontáveis foram as vezes que o tomei para me desligar deste plano. Dormia por um dia seguido, basicamente. Sem sair da cama, nem nada. Creio que, a partir dali, eu me joguei de cara num processo depressivo sem volta. Passavam-se os dias, as semanas e eu na mesma situação deplorável. Daquelas de causar pena mesmo, sabe? Mas eu ficava ali, trancafiada num espaço minúsculos, que mal cabia meus pensamentos desprezíveis, muito menos meu corpo que, aos poucos e assustadoramente, ia definhando.

Agora, o efeito do coquetel de hoje já começa a bater. Abater-me. Mais uma vez. Por completo. Os olhos pesam como guilhotinas. Eu estou retalhada. Visão turva. Como se tudo girasse ao meu redor. Cada vez mais veloz e furioso. É hora de deitar. Amanhã todo martírio retorna.

3 comentários:

  1. Por vezes eu queria que meus remédios me dispersassem do mundo.

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  2. Meu neuro também me receitou um anti-depressivo, mas frisou que não era pra ~depressão.
    RISOS

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  3. É dificil admitir, mas já estive na sua pele. Sei o quão ruim é, quando nos machucamos, perdemos nosso chão e nos prendemos a "pilulas da vida" achando que isso nos livrará do fundo do poço. Mas, sei também que não mudará nada. Por trás do teu texto sinto que não falas só das medicações, tem algo mais triste por trás. E eu entendo.

    Não sou amigo(a), mas eu já ti respeito.

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